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Fração do Exército Vermelho

(gh)23 de janeiro de 2007

Três décadas após o "ano do terror de 1977", pedidos de libertação e indulto de ex-terroristas da RAF reabrem feridas e provocam debate na Alemanha sobre o rigor da Justiça em condenar atos de terrorismo.

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Brigitte Mohnhaupt, ex-líder da RAFFoto: picture-alliance/ dpa

"Cinco vezes prisão perpétua mais 15 anos" foi a sentença proferida pelo Tribunal Superior Regional da Stuttgart, em 1985, para Brigitte Mohnhaupt, uma das líderes da organização terrorista Fração do Exército Vermelho (RAF). Seu companheiro, Christian Klar, levou pena de "seis vezes prisão perpétua mais 15 anos".

Os dois foram condenados pela morte do presidente do Dresdner Bank, Jürgen Ponto, do procurador geral da República, Siegfried Buback, e do presidente da Confederação Alemã dos Empregadores, Hanns-Martin Schleyer. Os assassinatos ocorreram em 1977, o chamado "ano do terror" na Alemanha.

A situação na época foi semelhante à que sucedeu os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 nos EUA. Desafiado pelos terroristas, de 1977 a 1981, o Estado alemão aplicou seis "leis de exceção" contendo 27 determinações que restringiam as regras do estado de direito e ampliavam o poder das autoridades de segurança.

Discussão sobre pena justa

O pedido da Procuradoria Geral da República, feito nesta segunda-feira (22/01), de colocar Mohnhaupt (presa há 24 anos) em liberdade condicional a partir de 30 de março próximo, bem como o requerimento de indulto de Klar (na cadeia há 24 anos), em avaliação pelo presidente alemão Horst Köhler, provocaram uma discussão no país sobre a pena justa para atos terroristas.

Mohnhaupt e Klar são dois dos quatro integrantes da RAF que não cooperaram com a Justiça e ainda se encontram presos. Os outros dois são Birgit Hogefeld (presa desde 1993) e Eva Haule (desde 1986).

Três dos 26 membros da organização condenados à prisão perpétua – Gudrun Ensslin, Andreas Baader e Jan-Carl Raspe – cometeram suicídio coletivo na prisão de Stammheim (Stuttgart) no outono de 1977, depois que fracassou uma tentativa da RAF de libertá-los.

Dezoito ex-integrantes da RAF já receberam indulto, nos últimos anos, dos presidentes Richard von Weizsäcker, Roman Herzog e Johannes Rau. Von Weizsäcker, o primeiro chefe de Estado alemão a dar este passo, argumentou que "a reintegração de ex-terroristas à sociedade é a melhor forma de enfrentar os terroristas de hoje".

Reação dos familiares das vítimas

RAF Bild von Hanns-Martin Schleyer
Foto do seqüestro de Hanns-Martin Schleyer pela RAFFoto: AP

Waltrude Schleyer, viúva de Hanns-Martin Schleyer, é contra a libertação de Mohnhaupt e Klar. "Não soltem os assassinos de meu marido. Eles sabiam exatamente o que estavam fazendo e até agora não mostraram arrependimento", disse à revista Spiegel Online.

Já Michael Buback, filho de Siegfried Buback e professor da Universidade de Göttingen, disse que o atual debate lembra um tempo terrível. "Para nós, eles são pessoas muito estranhas, que, por ódio à República Federal da Alemanha, mataram primordialmente o procurador geral e não nosso pai."

"O que me irrita e entristece é que ainda não sei quem baleou meu pai. Se agora se fala em clemência deveria se falar também sobre confissão e arrependimento", afirmou.

Clemência x Direito

Klaus Kinkel
Klaus Kinkel: 'Clemência deve prevalecer sobre o Direito'Foto: Deutsche Telekom Stiftung

"Após 24 anos de prisão, a clemência deve prevalecer sobre o Direito", argumenta o ex-ministro da Justiça e das Relações Exteriores Klaus Kinkel, do Partido Liberal, que defende um indulto para Klar. "O Estado pode mostrar seu vigor nesses atos de indulto", diz.

Já Klaus Pflieger, um dos dois procuradores gerais do Estado de Baden-Württemberg e responsável pela prisão de Mohnhaupt e Klar, adverte que "somente em casos muito excepcionais a clemência deve prevalecer sobre o Direito". Ao contrário de casos anteriores, não há motivos de saúde nem arrependimento dos réus que justifiquem a libertação, acrescenta.

Wolfgang Deuschl, diretor da cadeia de Aichach, na Baviera, onde Mohnhaupt está presa, diz não ter dúvida alguma de que "ela jamais voltará a fazer algo semelhante. Ela não vai assassinar mais ninguém nem cometer crimes. Esses tempos passaram". A decisão sobre o pedido de comutação da pena deve sair em meados de fevereiro próximo.

Segundo Horst Herold, presidente do Departamento Federal de Investigações (BKA) de 1971 a 1981, os dois ex-terroristas "deveriam pelo menos completar 60 anos antes de ser soltos". Mohnhaupt tem 57 anos, Klar tem 54.

Segundo o ex-ministro do Interior Gerhart Baum, também do Partido Liberal, "pela tradição jurídica alemã, pena de prisão perpétua não significa ficar preso pelo resto da vida. Vinte e quatro anos bastam. Outros criminosos, como Peter Jürgen Boock, receberam indulto após 18 anos de reclusão".

Baum disse entender os parentes das vítimas, "mas a sentença foi proferida em nome do povo e o Estado não é implacável. Até mesmo quem cometeu crimes graves pode ser reintegrado à sociedade. Esta é a nossa visão de pena e execução penal. Mas seria desejável que eles se distanciassem claramente de seus atos do passado".

Um outro argumento de Baum é que os ex-terroristas nunca foram tratados como prisioneiros de guerra, como eles queriam. "Nunca aceitamos a motivação política como justificativa de seus atos. Assassinato é assassinato. E, se na época eles foram tratados como criminosos normais, então temos de fazê-lo hoje também."