1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Caixa dentro da caixa dentro da caixa acústica

Simone de Mello4 de março de 2005

Com uma instalação de som e luz no interior da Neue Nationalgalerie de Berlim, o artista alemão Carsten Nicolai destaca complexidade do edifício de Mies van der Rohe como espaço de percepção.

https://p.dw.com/p/6KUM
Construção em forma de cristal resgata experimentos das vanguardas modernas

A Neue Nationalgalerie de Mies van der Rohe, em Berlim, é um museu programaticamente permeável ao entorno: a estrutura de metal envidraçada de todos os lados permite ao passante apreciar de fora do museu os objetos expostos e ao visitante integrar à apreciação dos objetos de arte as impressões dos arredores do Kulturforum, o complexo arquitetônico que também inclui a biblioteca (Staatsbibliothek) e a Filarmônica de Hans Scharoun.

Installation syn chron von Carsten Nicolai
Instalação 'syn chron', de Carsten Nicolai, dentro da Neue Nationalgalerie, de Mies van der RoheFoto: Presse

Dentro da Neue Nationalgalerie, o artista plástico e músico alemão Carsten Nicolai (40) criou a instalação de luz e som syn chron, um espaço em forma de cristal cravado em meio ao cubo de Mies van der Rohe, a ser adentrado como caixa de ressonância de vibrações sonoras e luminosas. O projeto – parte do programa do Festival Maerzmusik – surgiu de uma iniciativa conjunta da Neue Nationalgalerie com a associação de incentivo à música contemporânea Freunde Guter Musik Berlin, uma iniciativa que promove uma série de mostras com obras musicais de artistas plásticos.

Cristal em vibração

Installation syn chron von Carsten Nicolai in der Neuen Nationalgalerie Berlin
Interior da instalação 'syn chron', de Carsten NicolaiFoto: Presse

Nicolai considera sua instalação syn chron uma "membrana" ou "interface" que funciona ao mesmo tempo como suporte de imagens e corpo de ressonância. O som minimalista de Nicolai, que incorpora sobretudo a musicalidade do ruído eletrônico, sai por alto-falantes instalados diretamente na membrana, fazendo toda a superfície vibrar e transformando o cristal num corpo acústico. O som é programado para gerar fenômenos luminosos, a serem apreendidos tanto no interior da instalação quanto de fora. O que liga som e luz, além disso, é o caráter elementar dos padrões que se alternam em variações diurnas e noturnas.

Carsten Nicolai, artista nascido em Karl-Marx-Stadt (antiga e atual Chemnitz), na ex-Alemanha Oriental, usa o som como ponto de partida e material de seus trabalhos plásticos. "No contexto artístico, não penso musicalmente", declarou Nicolai numa recente entrevista ao diário taz. "Geralmente são coisas que se desvendam pelo mero som, sem qualquer melodia ou ritmo. O que me interessa é o que o som faz com a gente e o que a gente faz com o som. Posso gerar imagens a partir do som? Posso construir uma usina desta forma? Posso lavar roupas com isso? É mais fácil de responder este tipo de questão na arte do que na música. Isso já foi feito por artistas como Nam June Paik ou Gary Hill nos anos 60."

Carsten Nicolai
Carsten Nicolai (Karl-Marx-Stadt, 1965)Foto: AP

Sem se limitar a uma estrita soundart, a obra de Nicolai – à qual a Schirn Kunsthalle de Frankfurt dedica até 28 de março a representativa mostra Anti Reflex – redescobre o ruído e os suportes do aparato tecnológico e da mídia como material da arte. Seus objetos minimalistas, em geral bem menos complexos em termos técnicos do que a instalação syn chron, exploram possibilidades de tornar apreensíveis aos sentidos freqüências sonoras e luminosas geralmente imperceptíveis.

Achados e perdidos

O interessante de observar nesta primeira instalação de grande porte do artista, construída em colaboração com engenheiros e arquitetos, é um processo de artificialização do objeto de arte. Em trabalhos anteriores mais modestos, Nicolai simplesmente coloca em evidência interferências sonoras e visuais, tornando-as esteticamente apreciáveis. Uma série de toca-discos idênticos, com fone de ouvido, nos quais o ouvinte/observador pode ouvir o ruído da agulha no vinil ou então um transistor mínimo emitindo apenas interferências: seus sons, por mais que sejam gerados artificialmente, soam como achados, found sounds.

Em syn chron, todavia, os sons são compostos como música, adquirindo uma artificialidade comparável à do espaço criado com finalidade de auditório. Em torno desta concha, o edifício de Mies van der Rohe reflete os faróis dos carros bem como a luz dourada da Filarmônica nos vidros e deixa penetrar o som do tráfego noturno, dando mais margem ao acaso e à descoberta de sons do que a instalação perfeitamente orquestrada de Nicolai.