1. Ir para o conteúdo
  2. Ir para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Alassane Ouattara às portas do poder

6 de abril de 2011

Veterano opositor virou símbolo da crise de identidade que divide a Costa do Marfim. Ouattara é reconhecido pela comunidade internacional, inclusive a União Africana, mas criticado por humanitários por tolerar violência

https://p.dw.com/p/RG01
Alassane Ouattara responde a perguntas de jornalistas durante coletiva de imprensa no Hotel Golf, em AbidjanFoto: AP

Alassane Dramane Ouattara, 69, está perto de atingir o objetivo que acalenta há cerca de 15 anos: assumir a presidência da Costa do Marfim. Ouattara tem experiência com o poder – já foi Primeiro-ministro da Costa do Marfim, de 1990 a 1993, durante o governo do chamado “Pai da Nação”, Félix Houphouët-Boigny, o primeiro presidente do país ocidental africano após a independência.

Mas Alassane Ouattara também conhece bem a luta armada. Foi uma figura-chave ao lado dos rebeldes que, em 2002, protagonizaram uma guerra civil de curta duração contra as forças governistas de Laurent Gbagbo. O conflito dividiu o primeiro produtor mundial de cacau entre o norte rebelde, majoritariamente muçulmano, e o sul cristão.

Porém, atualmente, a característica determinante de Alassane Ouattara parece ser o fato de ele ser um favorito das potências ocidentais. A mulher de Ouattara, Dominique Folloroux, é francesa, e, no casamento, o padrinho foi ninguém menos que o presidente francês Nicolas Sarkozy.

Origens burquinabês atrapalharam candidaturas

Alassane Ouattara
Casado com a francesa Dominique Folloroux, o ex-Primeiro-ministro tornou-se símbolo de conflitos de identidade nacional na Costa do MarfimFoto: Picture alliance/dpa

Há 69 anos, nascia Alassane Ouattara em Dimbokro, no centro da Costa do Marfim. Ouattara cursou a maior parte do ensino secundário no Burkina Faso. Nos Estados Unidos, obteve em 1967 um doutorado em economia, e depois fez carreira no Fundo Monetário Internacional em Washington. No final dos anos 1980, o então presidente marfinense Félix Houphouët-Boigny chamou Ouattara, conhecido pela ambição, de volta à Costa do Marfim.

Em 1983, Ouattara tornou-se vice-governador do Banco Central dos Estados da África Ocidental, BCEAO. No início dos anos 1990, ascendeu ao cargo de Primeiro-ministro da Costa do Marfim, sendo o primeiro desde a independência do país. Ouattara ficou no cargo até 1993, quando morreu Houphouët-Boigny.

Avaliando que o escrutínio não seria realizado de forma transparente, Alassane Ouattara recusou-se a participar da presidencial em 1995, face a Henri Konan Bédié, que então assumiu as rédeas da Costa do Marfim. O campo de Bédié, por seu lado, temia as ambições de Ouattara e desenvolveu o conceito de “ivoirité”, ou “marfinidade”, numa tradução livre. Com isso, pretendia-se provar a inegibilidade de Ouattara, cujos pais são do Burkina Faso.

Quando, em 1999, o presidente Bédié foi destituído pelos militares, Ouattara tomou novo impulso. Porém, novamente, a candidatura foi negada – desta vez pela junta no poder, que também fez referência à chamada lei da “ivoirité” e apontou para o que chamou de “nacionalidade duvidosa” de Ouattara.

Este foi um dos motivos para a guerra civil de 2002, diz Ouattara hoje. “As questões sobre identidade levaram a injustiças, a matanças, a massacres”, afirma o presidente eleito reconhecido internacionalmente. “Foi uma política que teve como consequência a criação de tensões, que acabaram por sua vez levando primeiro ao golpe de Estado e depois à rebelião”.

Naquela altura, centenas de milhares de imigrantes do Burkina Faso, do Mali, do Níger e de outros países acabaram se transformando em cidadãos de segunda classe, de um dia para o outro. E, casado com uma francesa, Ouattara se tornou mais que nunca o símbolo da fratura de identidade que rasga a Costa do Marfim.

Até hoje, há boatos dizendo que, na época, Ouattara teria mobilizado os generais do norte para tirar Gbagbo do poder – já que o conflito civil de 2002-2003 foi motivado por uma tentativa de golpe de Estado por militares. A informação nunca foi comprovada.

Ouattara não seria diferente de Gbagbo, acusam organizações humanitárias

Elfenbeinküste Bürgerkrieg
Soldados leais a Alassane Ouattara preparam-se em checkpoint próximo a Abidjan (6/4)Foto: AP

No dia 28 de março, as Forças republicanas – essencialmente a ex-rebelião, pró-Ouattara, que domina o norte do país, iniciou ofensiva contra as forças leais ao presidente cessante, Laurent Gbagbo. Num massacre na cidade de Duékoué, as Nações Unidas contaram mais de 300 mortos, a maior parte deles teriam sido vítimas das forças leais a Alassane Ouattara, que rebateu as acusações e disse que seus soldados haviam matado apenas milícias, e não civis.

Durante a luta contra o governo, na última década, Ouattara e seus rebeldes já enfrentaram várias acusações de abusos de direitos humanos. Diversas organizações humanitárias dizem que a disposição de Ouattara para tolerar a violência o torna similar ao adversário, Laurent Gbagbo.

Após a eleição de novembro passado, a Comissão eleitoral anunciou, no dia 2 de dezembro, que o veterano opositor venceu o segundo turno do escrutínio presidencial com 54,1% dos votos, um resultado validado pelas Nações Unidas. Mas o Conselho Constitucional, que apoia o presidente cessante Laurent Gbagbo, disse considerar os resultados inválidos e deu a vitória a Gbagbo, com 51,45%.

Algo que o campo de Ouattara não aceitou. Apoiado internacionalmente, Ouattara, agora, fala como estadista, e inicialmente apostou na diplomacia para tentar obrigar o rival a sair do poder. “Apesar dos vários apelos ao senhor Laurent Gbagbo e seus aliados, pedindo uma transferência pacífica de poder, a única resposta a esta mão estendida foi a violência. Para pôr fim à escalada de violência no nosso país, as Forças Republicanas da Costa do Marfim concretizaram a sua tarefa de proteger a população civil e seus bens das milícias e dos mercenários a serviço de Laurent Gbagbo”, disse Ouattara, em declaração. “As Forças republicanas decidiram restabelecer a democracia e fazer com que o voto do povo seja respeitado.”

Autora: Renate Krieger (com agências afp/rtr/dpa)

Revisão: António Rocha

Flash-Galerie Elfenbeinküste Proteste Alassane Ouattara
Apoiantes de Ouattara em Abidjan, em dezembro de 2010, durante protesto após divulgação de resultados eleitoraisFoto: AP
Saltar a secção Mais sobre este tema