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Retorno das religiões

Erning Zhu (sv)10 de setembro de 2007

Diante do atual renascimento da religião como fenômeno global, as sociedades seculares enfrentam o desafio de definir até onde símbolos religiosos podem estar presentes na vida pública.

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Simbolismo religioso: compatível com o secularismo?Foto: DW / Aida Cama

Na parede da sala de Stefan Muckel, professor de Direito Canônico da Universidade de Colônia, está dependurado um crucifixo de metal, em frente a uma foto do papa Bento 16. Isso não é problema no ambiente acadêmico, garante o professor, pois cada um pode escolher, como quer, a decoração do próprio escritório.

E dependurar o crucifixo nas salas de aula, é possível? Não, revida Muckel, pois isso causaria provavelmente um "problema em relação à neutralidade". Ou seja, em determinados espaços públicos, como um tribunal ou uma sala de aula, é necessário manter, neste sentido, uma posição "neutra". Nestes lugares, não se deve passar a impressão de que se tem predileção por alguma religião especificamente.

Contradições de uma sociedade secular

Na Alemanha, a escolha religiosa é considerada, em primeiro plano, uma opção individual e particular de cada um. As salas dos professores onde podem ser encontrados símbolos religiosos não são, no entanto, um espaço considerado privado.

Kollekte Klingelbeutel
Imposto religioso: recolhido pelo Estado e repassado às IgrejasFoto: picture-alliance/dpa

Percebe-se aí uma contradição. A Alemanha é, por um lado, de acordo com sua Lei Fundamental, um Estado secular, neutro do ponto ideológico-filosófico e religioso, que teoricamente se posiciona em prol da separação entre Igreja e Estado. Na prática, contudo, essas duas instâncias se misturam de várias formas, ao contrário do que acontece, por exemplo, na França, onde há uma separação rigorosa dos dois setores.

Essa contradição repercute de diversas maneiras na sociedade. Na Alemanha, não há nem uma religião, nem uma Igreja estatais. Mesmo assim, o Estado coopera tanto material quanto ideologicamente com as Igrejas. Segundo Muckel, não seria, por exemplo, uma obviedade, o fato de a Constituição Federal permitir ao Estado a arrecadação de impostos para a Igreja, tampouco a regra que estabelece aulas de religião, nas escolas públicas, como disciplina regular.

Fazendo uso de recursos públicos, a Igreja engaja-se bastante no país em setores de assistência social, como jardins-de-infância, escolas e hospitais. "Não é à toa que as Igrejas são, na Alemanha, depois do serviço público, o maior empregador", resume o especialista em Direito Canônico.

Retorno às religiões

É verdade que a Igreja vive lamentando a perda crescente de fiéis, o que provoca, em tese, uma crise eterna da instituição e uma redução dos "impostos religiosos". Em contraste peculiar a este cenário, porém, percebe-se, ao mesmo tempo, uma nova tendência de retorno da religião nas sociedades contemporâneas. Um retorno que não se restringe, de forma alguma, apenas ao cristianismo.

Em maio deste ano, 500 mil pessoas festejaram o Congresso da Igreja Luterana Alemã em Colônia. Em julho último, o Dalai Lama foi recebido em Hamburgo com tapetes vermelhos. Na ocasião, 50 mil pessoas participaram de seminários budistas na cidade. Neste contexto, não há de se esquecer também a Jornada Mundial da Juventude, uma das grandes confraternizações internacionais que aconteceram na Alemanha em 2005.

Construção de mesquita não é questão jurídica

Onde há religião, há símbolos. Todas as religiões fazem uso explícito de rituais e simbolismos. Elas vivem disso. O que faz com que a pergunta já esteja, em princípio, lançada: quantos símbolos religiosos uma sociedade secular como a alemã consegue suportar, sem abandonar seu secularismo?

Deste ponto de vista meramente jurídico, diz Muckel, não há barreiras intransponíveis que impeçam a construção de uma grande mesquita em Colônia. A discussão sobre o assunto acontece, segundo o especialista, na esfera política.

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Arquiteto Paul Boehm com maquete de mesquita a ser construída em Colônia: projeto polêmicoFoto: AP
Weltjugendtag - Pilger warten auf den Papst
Jornada Mundial da Juventude: encontro das massasFoto: dpa

Que altura podem ter os minaretes, a cúpula pode ter quais proporções, o quão imponente pode ser a obra? Em suma: quantas mesquitas suporta uma cidade liberal como Colônia? Por que as pessoas que se opõem à sua construção se sentem tão incomodadas? Por que a construção de uma igreja não representaria problema algum, enquanto a de uma mesquita sim? As reações são muitas, os muçulmanos se sentem discriminados e feridos no direito fundamental de praticarem sua religião.

Proibição de alguns símbolos não-cristãos

Também em relação aos chamados "veredictos do véu" os muçulmanos se sentem tratados de forma diferenciada na Alemanha. Mesmo que, na maior parte dos estados do país, tenham sido aprovadas leis que proíbem símbolos religiosos no espaço público, estas proibições se dão de forma não igualitária.

Deutschland Düsseldorf Gericht bestätigt Kopftuch-Verbot
Professora da rede pública com véu muçulmano: proibição por leiFoto: picture-alliance/ dpa

Em Berlim, por exemplo, foram banidos das salas de aula símbolos de qualquer religião. Já em outras regiões do país, por outro lado, os símbolos cristãos e judeus continuam sendo permitidos, enquanto o véu muçulmano, signo do islã, é proibido.

Se uma professora muçulmana dá aulas com o véu na cabeça, dita o veredicto sobre o assunto, isso é visto como demonstração religiosa por um islã fundamentalista, que oprime os direitos das mulheres. Ao mesmo tempo, a atitude de cobrir a cabeça com o véu é apontada como infração à neutralidade das escolas alemãs.

Com um quipá (solidéu usado pelos judeus) cobrindo a cabeça, uma cruz dependurada no pescoço ou até mesmo com um hábito religioso católico cobrindo todo o corpo, é permitido dar aulas em quase todos os estados alemães – quando se trata de símbolos da tradição cristã-ocidental, vale, quase sempre, o argumento da legislação estadual.

O que isso significa, porém, perante a neutralidade do Estado frente a todas as religiões e concepções de mundo, uma vez que o Tribunal Constitucional Federal quer exatamente "tratar de maneira igualitária" todas as crenças?

Esta questão vai ocupar cada vez mais o centro do debate, acredita Gerd-Ulrich Kapteina, porta-voz do Tribunal Administrativo de Düsseldorf, em entrevita à Deutsche Welle. O tribunal confirmou no último 14 de agosto o recente veredicto acerca da proibição do uso do véu muçulmano por professoras nas escolas da rede pública, tendo salientado, no entanto, que uma diferenciação entre símbolos religiosos islâmicos e cristãos não é tolerável.

Ao lado de várias outras questões problemáticas, o exemplo da polêmica em torno do lenço mostra quais desafios o ressurgimento das religiões traz para a sociedade secular. A Alemanha, pelo menos até agora, ainda não encontrou as respostas ao problema.