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Música Erudita

Paulo Chagas / Augusto Valente2 de janeiro de 2008

A cena musical da Alemanha se caracteriza por uma riqueza de tradições e eventos, que se manifestam em densa rede de organizações culturais, pedagógicas e econômicas.

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Bundesjugendorchester
Foto: Bundesjugendorchester

Poucos países possuem uma herança musical tão significativa quanto a Alemanha, cujo patrimônio não se restringe a suas fronteiras geográficas. Ele abrange tanto a obra de compositores alemães, como Johann Sebastian Bach, Beethoven, Schumann, Mendelssohn, Brahms, Wagner e Hindemith, como também os austríacos Haydn, Mozart, Schubert, Schönberg, Berg e Webern e muitos outros que viveram no espaço do idioma e da cultura alemães.

Historicamente, a estrutura política descentralizada das cidades-estado determina a riqueza cultural da Alemanha. Desde séculos, aristocratas e burgueses fomentavam a vida musical nas cortes locais, criando suas próprias orquestras, coros e teatros de óperas. A música tornou-se não apenas uma expressão do poder, mas enraizou-se na consciência coletiva como fator de integração social e cultural. Isto foi o que garantiu ao longo de vários séculos, e até hoje, a diversidade da cultura musical na Alemanha.

Ao contrário de outros países europeus, a música na Alemanha se manifesta em toda parte, tanto nas grandes metrópoles como nas pequenas cidades do interior, assumindo características e cores locais. O grande número de instituições e organizações cresceu ainda mais a partir de 1990, com a Reunificação. Por outro lado, isto provocou uma crise financeira, colocando em xeque os modelos de financiamento da vida musical, arcados em grande parte pelo Estado.

Rede de atividades musicais

Os subsídios à atividade musical pela União, os governos estaduais e municipais são complementados pelo patrocínio de empresas, mecenas e iniciativas individuais. Cada um dos 16 estados alemães possui instituições públicas próprias que organizam a vida musical em termos políticos, artísticos e financeiros. Esta rede de iniciativas contribui para a criação de um mercado musical e a projeção internacional da Alemanha no mundo da música erudita.

Vejamos os principais núcleos desta rede:

– Cerca de 80 teatros de ópera, a maioria possuindo orquestras próprias, e que apresentam também espetáculos de teatro e dança. Eles atraem cerca de 40 milhões de espectadores, a cada ano.

– Mais de 140 orquestras profissionais, incluindo orquestras sinfônicas, de câmara e conjuntos específicos dedicados, por exemplo, à música antiga e contemporânea.

– Uma rede de emissoras de rádio e televisão de direito público que dispõem de suas próprias orquestras, big bands e coros, realizando programas musicais e produções fonográficas. Seu papel é especialmente importante para a música contemporânea, com a encomenda de novas obras e a promoção de oficinas e debates sobre as tendências atuais.

– Um amplo sistema de educação musical constituído por escolas superiores de música, faculdades de pedagogia musical, conservatórios de nível médio, academias de qualificação profissional, escolas municipais de música para crianças e adultos e instituições pedagógicas das Igrejas Católica e Luterana.

– Milhões de músicos amadores organizados em associações musicais e também vinculados às Igrejas Católica e Luterana.

Hänsel und Gretel in Erfurt Märchenoper Hänsel und Gretel von Engelbert Humperdinck
'Hänsel e Gretel' na Ópera de ErfurtFoto: dpa

– Um grande número congressos, cursos e eventos musicais de dimensões variadas e para todos os gostos. Dentre os mais de cem festivais de música erudita destacam-se os de Leipzig (dedicado a J.S. Bach), Göttingen e Halle (Händel) e Bonn (Beethoven).

– Organizações e medidas de incentivo: concursos, prêmios, bolsas de estudos, orquestras, coros e conjuntos específicos para jovens e instituições sociais para artistas.

– Bibliotecas públicas de música, bibliotecas científicas, arquivos e institutos de pesquisas, centros de documentação, coleções de instrumentos, museus e memoriais.

– Editoras de música, fábricas de instrumentos musicais, gravadoras e selos fonográficos, ampla rede de lojas e comércio musical, feiras e exposições, sociedades de direitos autorais.

– Jornais e revistas especializados em música, anuários, catálogos diversos, serviços por internet.

Grandes e pequenos centros

Semperoper in Dresden
Interior da Semperoper de DresdenFoto: picture-alliance / dpa

Alguns centros se destacam no panorama da música alemã. O principal deles é a capital, Berlim, que congrega nada menos que três teatros de ópera (Deutsche Oper, Staatsoper e Komische Oper). A história de suas oito orquestras sinfônicas inclui nomes como Wilhelm Furtwängler, Herbert von Karajan, Claudio Abbado, Kent Nagano, Daniel Barenboim. A elas veio unir-se em 2007 a Neues Sinfonieorchester Berlin.

Munique, capital da Baviera, é o segundo maior centro musical, com dois teatros de ópera e quatro orquestras sinfônicas. Seguem-se, em termos de importância, as cidades de Hamburgo, Colônia, Düsseldorf, Frankfurt, Stuttgart, Dresden e Leipzig. Uma das particularidades da Alemanha, entretanto, é o peso da vida musical de cidades pequenas e médias, como por exemplo Freiburg, Ulm, Halle, Münster, Bonn, Bamberg, Darmstadt ou Potsdam.

O público alemão tem, a cada noite, uma oferta abundante de óperas, concertos, festivais e outros eventos musicais. A temporada musical corresponde ao período letivo: começa no mês de setembro e estende-se até meados do ano seguinte. Entretanto, mesmo no verão, há numerosos festivais e espetáculos especiais.

Meca musical

A partir da segunda metade do século 20, a Alemanha tornou-se uma meca da música contemporânea, inclusive música eletroacústica e teatro musical. Parte desta aura e vitalidade se mantiveram até hoje. Compositores como Helmut Lachenmann, Wolfgang Rihm e o teuto-argentino Mauricio Kagel contam entre os expoentes da música contemporânea mundial.

Uma das tendências dos últimos anos é a conquista de novos espaços e contextos para a música. Por exemplo, a tradicional região industrial do Ruhr é agora um centro de produção musical: suas fábricas e instalações industriais converteram-se em locais de espetáculos.

A qualidade da vida musical alemã atrai músicos do mundo inteiro. Anne-Sophie Mutter, David Garret, Tabea Zimmermann, Waltraud Meier, Thomas Quasthoff, Nikolaus Harnoncourt, Helmut Rilling, Christian Thielemann são apenas alguns dos artistas alemães atualmente compondo o primeiro escalão da música internacional.

Festivais e escolas

Royston Maldoom
Filme 'Rhythm is it' documenta projeto da Filarmônica de Berlim com coreógrafo Royston Maldoom

Os festivais de música de porte internacional também constituem um importante fator de atratividade e fluxo para os músicos de ponta. Além dos eventos já mencionados, cabe citar:

– O Festival de Bayreuth, criado em 1876 por Richard Wagner e voltado à execução de suas óperas.

– O Festival de Donaueschingen, que desde 1922 se dedica à difusão da música contemporânea.

– O Curso de Férias de Darmstadt, fundado em 1946, e pelo qual passaram várias gerações de compositores e intérpretes que marcam a música contemporânea mundial.

Também longa é a lista dos virtuoses instrumentais e vocais de todas as nacionalidades que devem parte essencial de sua formação aos docentes e instituições do país. As escolas de música alemãs possuem uma proporção significativa de estudantes estrangeiros, parte dos quais se integra às instituições musicais – orquestras, coros, teatros, escolas – contribuindo para manter o elevado nível de criação e interpretação.

Crise de interesse

Porém uma longa e venerável tradição não basta para manter viva uma forma de arte. Também a música erudita precisa de público, e sua falta vem provocando uma crise que ameaça a existência do setor.

As causas são múltiplas. Como o resto do mundo, a sociedade alemã evolui e redefine seus valores; a "formação clássica" e o "cidadão culto" – que lia os livros indispensáveis, frequentava regularmente concertos e teatros – perdem inexoravelmente relevância. A tradição de executar música clássica como hobby (hausmusik) tampouco resiste às influências globalizantes.

Plakat Kent Nagano dirigiert Wagner
Cartaz: 'Nagano dirige Wagner'Foto: Festspielhaus Baden-Baden

Um caminho tem sido desenvolver estratégias inovadoras, como campanhas publicitárias ousadas e programas combinando clássico e jazz, rock ou pop. Porém, se o público da música erudita é cada vez mais idoso e reduzido, a solução definitiva só pode ser investir nas novas gerações, despertar o interesse pela arte musical desde a infância, formando plateias.

Teoricamente, a escola seria a plataforma ideal para esta tarefa. Na prática, as aulas de música têm status menor nos currículos escolares e são as primeiras a serem sacrificadas nos cortes de verbas.

Maior sucesso alcançam os projetos que aproximam colegiais e artistas atuantes. Notáveis neste aspecto têm sido as oficinas da Filarmônica de Berlim, iniciadas pelo maestro inglês Simon Rattle. Unindo música e movimento, elas permitem aos jovens – especialmente da periferia da capital – vivenciar diretamente o repertório moderno e contemporâneo, expandindo seus horizontes culturais.

No início do século 21, a música erudita na Alemanha enfrenta o grande desafio de (re)encontrar o seu lugar como parte viva da sociedade.

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