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A arte além do muro

(ns)25 de julho de 2003

Mais de uma década após a queda do Muro de Berlim, a capital apresenta um panorama dos 40 anos de arte na ex-República Democrática Alemã. Tentativas anteriores de realizar mostras semelhantes acabaram em fiasco.

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Escultura de T. Balden e o quadro "Pausa no trabalho", de W. SitteFoto: AP

Monumental é o adjetivo certo para descrever uma exposição de 400 pinturas, esculturas e fotografias de 135 artistas, que abarcam quatro décadas de arte num país engolido pela história. Percorrer as 21 salas da Neue Nationalgalerie, onde as obras estão exibidas desde sexta-feira (25/07) até 26 de outubro, equivale a fazer uma viagem pelo tempo, entre a arte encomendada pelo Estado, as tentativas de incorporar as principais correntes do século apesar do isolamento do país, e a rebelião artística dos que procuraram seguir seu caminho.

Trata-se de uma mostra da "arte na RDA" e não de "A arte da RDA" (que representava o Estado), como enfatizou o diretor-geral dos museus estatais de Berlim, Peter-Klaus Schuster. O leitor desavisado pode não encontrar muita diferença entre uma e outra formulação. No entanto, a diferenciação é importante, tendo em conta que na Alemanha Oriental não havia apenas artistas que se curvaram ao cânon ditado pelo Estado, de glorificação da classe trabalhadora, nos moldes do realismo socialista soviético.

Depois dos escândalos, a cautela

Acontece que a mostra atual teve precedentes lamentáveis, em Berlim, Nurembergue e Weimar. Na exposição "Ascensão e Queda do Modernismo", realizada em 1999, em Weimar (no Leste Alemão), a arte fomentada pelo Estado alemão oriental acabou sendo equiparada à estética nacional-socialista. O escândalo foi tão grande que a exposição acabou sendo fechada antes do término. O visitante do ocidente achou que todos os artistas do leste produziam somente imagens ditadas pelo regime. E os do leste, que havia a má intenção ocidental de só expor o que se enquadrava dentro do esquema de "arte estatal".

Depois desse episódio, e tendo em conta a difícil aproximação leste-oeste após a reunificação, todos ficaram extremamente cautelosos ao falar de arte da República Democrática Alemã, justamente para evitar uma estigmatização. "Qualquer palavra sobre a arte da RDA pode ser um erro", disse Schuster à Deutsche Welle. Bons conhecedores do terreno artístico do leste da república, os curadores da atual exposição, Eugen Blume e Roland März, trataram de apontar algumas tradições e a diversidade da arte alemã oriental, selecionando obras com "validade artística duradoura". O que não significa ignorar todas as com conotação socialista.

Penck e o Milagre Azul

Ausstellung Kunst der DDR
Quadro "Das grosse Stadtbad" (A grande piscina pública), de Wolfgang Smy, e a plástica "Du musst doch bewaffnet sein" (Você precisa andar armado), de Hans Scheib.Foto: AP

O visitante se depara, logo na entrada, com a imponente "Festa de Natal 1524", de Werner Tübkes, um bom exemplo da "loucura" da arte estatal, segundo März. A seu lado está uma escultura patética de Fritz Cremer, um dos mais conhecidos exemplos dessa arte. Logo ao lado, vê-se uma pintura de A.R. Penck, com seus homenzinhos coloridos, e outra do mestre da arte informal, Hermann Glöckner - dois artistas que fugiram dos ditames oficiais. Penk é um dos 21 artistas banidos da RDA e que tiveram sua cidadania cassada, cujas obras agora são exibidas na Galeria Nacional.

Foi principalmente em centros urbanos como Berlim, Dresden e Leipzig que pintores e artistas conseguiram desenvolver uma linguagem e um estilo próprios. Quem percorre a exposição percebe isso em todas as épocas, desde o início da construção do socialismo até a última parte, intitulada "Utopias e realidade - o fracasso da história". Grupos de artistas como "O milagre azul", de Dresden, formados em torno de Penck e Strawalde, ou atores individuais como Gerhard Altenbourg, Carlfriedrich Claus ou Hermann Glöckner sentiam-se ligados às grandes correntes artísticas do século XX, do impressionismo à arte pop ou à escola informal. Mesmo o retrato de um trabalhador lendo na pausa, de Willi Sittes (1959), remonta à pintura otimista de um Ferdinand Leger, e o "Retrato de uma estudante", de Tübkes (1959) bem poderia ser um Picasso.