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Concorrência à internet

5 de agosto de 2009

O cinema em 3D oferece ilusões espaciais com as quais o monitor do computador não pode competir. Mas a técnica já fracassou junto ao público nas décadas de 50 e 70, quando os inimigos eram a televisão e videocassete.

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'Dá quase para tocar!'Foto: AP

O público fixa a tela, hipnotizado: o monstro raptou a mocinha e a levou para sua caverna subaquática. Agora é hora de devorar rapidinho o vilão do filme. O monstro nada diretamente na direção da câmera, rompe os limites da tela e rodopia virtualmente pela sala de projeção.

Der Schrecken vom Amazonas
Cartaz alemão de 'O monstro da Lagoa Negra – 3D'Foto: Piccolo-Film

E aí todo o mundo começa a passar mal. De início, os espectadores de óculos bicolores se sentem tontos, segue-se a náusea violenta. Os primeiros a vomitar são os da plateia, mais um pouco e a onda chega até os balcões.

Tais cenas eram dia-a-dia nos cinemas dos anos 50, toda vez que se exibia a versão tridimensional do filme de terror O monstro da Lagoa Negra. "Realmente ocorria de os espectadores se sentirem muito enjoados com a técnica original dos filmes 3D", relembra o especialista em cinema Jürgen Trimborn.

Técnica primitiva

A filmagem era feita com duas câmeras postadas lado a lado. Uma película era tingida de vermelho, a outra de verde, e depois as imagens eram superpostas, ligeiramente defasadas. Os óculos com uma lente de cada cor, impediam, respectivamente, um dos olhos de perceber uma das imagens.

O cérebro se encarregava de combinar o que via numa imagem plástica, "tridimensional". Entretanto, o centro de equilíbrio cerebral reagia a essas informações visuais conflitantes como se estivesse numa montanha russa. "Mas os efeitos 3D eram espantosamente realistas", elogia Trimborn.

A técnica tridimensional foi lançada na década de 1950, com grande sensação, nos Estados Unidos, como uma arma contra a popularidade galopante da televisão. Em vão. Hoje em dia, tenta-se vender lançamentos como Dia dos Namorados macabro e Up sob o rótulo de inovação absoluta. A rigor, trata-se de nada mais do que a reanimação de uma técnica que já fracassou várias vezes junto ao público.

Odiado por Hitchcock

Alfred Hitchcock in Cannes
Alfred Hitchcock (1899-1980)Foto: picture-alliance/ dpa

Até mesmo Alfred Hitchcock, o grande mestre britânico do suspense, foi forçado pelo estúdio a rodar Disque M para matar (1954) em 3D. Várias vezes ele coloca um abajur diante da protagonista, Grace Kelly, ou focaliza a cena através de um copo de bebida, a fim de obter um efeito de profundidade. A técnica vinha, portanto, na frente da trama, a arte tinha que se subordinar. E o mesmo acontece nos filmes em três dimensões de hoje em dia.

Na opinião de Trimborn, o 3D contradiz o próprio processo artístico do cinema. "Não esqueçamos que, em sua origem, a fotografia e o filme são bidimensionais, assim como a pintura. E uma das artes é alcançar um efeito espacial tridimensional através de luz, posição da câmera, enquadramento, objetiva e foco adequados."

Na técnica 3D, por outro lado, a perspectiva é obtida por meios técnicos, em parte com o auxílio do computador, e "a competência de um fotógrafo se torna irrelevante, e isso não pode ser positivo para a arte cinematográfica", critica o especialista.

Emoções baratas

Quando o cinema voltou a entrar em crise no final da década de 70, com a propagação do videocassete e do home video, recorreu-se mais uma vez à tecnologia 3D, apesar de todas as ressalvas artísticas.

Entre outras, produziu-se uma imitação barata do Tubarão de Steven Spielberg. Em substituição aos bicolores, eram utilizados agora óculos de polarização, que também provocavam dor de cabeça após algum tempo.

Foi nessa mesma época que um representante do cinema-catástrofe, Terremoto, chegou às salas em sensurround, uma técnica que teve vida bastante efêmera: sons supergraves faziam vibrar as cadeiras de um modo que chegava a excitar sexualmente alguns expectadores.

Experimentos desse tipo lançaram o cinema – à velocidade da luz – no mundo dos saltimbancos, dos prestidigitadores e do espetáculo barato: justamente onde ele nascera, cem anos antes.

Tentativa desesperada

A atual crise do cinema, desencadeada – entre outros fatores – pela oferta global e permanente de imagens e filmes na internet, faz o 3D ressuscitar, mais uma vez.

Filmplakat My Bloody Valentine
'Novidade' de mais de cinco décadasFoto: Kinowelt

Talvez se trate simplesmente de uma moda passageira. Só que uma moda que eleva tremendamente os custos da produção cinematográfica. E no momento, só umas poucas salas estão equipadas para fazer jus à inovação. A maior parte das películas produzidas em 3D é exibida paralelamente em projeção convencional, sem qualquer efeito tridimensional.

O 3D com certeza atrairá, pelo menos por algum tempo, um público mais jovem e sedento de sensações. Mas será que o cinema precisa de uma terceira dimensão? Afinal, todos os grandes cineastas, mesmo alguém fanático pelas novidades técnicas como Stanley Kubrick, sempre consideraram o 3D uma grande bobagem.

Seja como for, a nova onda 3D está aí, fazendo estardalhaço. Mas ao final, acabará revelando sua verdadeira e pobre realidade: é uma desesperada tentativa da indústria de fazer frente à nova concorrência, após ter sobrevivido à televisão e ao videocassete.

Autor: Robert Bales
Revisão: Alexandre Schossler