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1º de julho de 1926

Augusto Valente1 de julho de 2018

Em 1º de julho de 1926, nascia um dos músicos alemães mais bem-sucedidos do século 20. Moderno demais para a burguesia, "liberal de limusine" para a vanguarda, Henze permanece uma figura controversa.

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Foto de setembro de 1965Foto: picture-alliance/dpa

Quem não aceitar, sem questionar, a sentença sumária da intelligentsia musical – "epígono", "reacionário", "anacrônico" – terá dificuldade para definir com uma palavra a personagem Hans Werner Henze.

Uma das habilidades mais admiráveis do compositor é a de combinar técnicas e elementos musicais os mais díspares, da melodia lírica ao complexo sonoro eletroacústico, do leitmotiv wagneriano ao serialismo estrito e os dispositivos aleatórios. Uma liberdade que, por outro lado, oferece flanco a críticas ainda mais ferinas: "oportunista", "inconsequente", "eclético".

Será Henze, portanto, um reacionário oportunista? Nesse caso, onde se encaixariam seu ativismo político, suas idôneas tentativas de usar a música contemporânea como instrumento de resistência, seus anos de "terror da burguesia" e o consequente preço que pagou em sua carreira?

É preciso mais de uma palavra para defini-lo.

Desconfiado dos alemães

Hans Werner Henze nasceu em 1º de julho de 1926 em Gütersloh, na região alemã da Vestfália. Um entre seis filhos, resolveu estudar música contra a vontade dos pais. Ainda adolescente, sentiu-se atraído pelas composições modernas, então condenadas pelo regime nazista como "degeneradas".

A identificação do pai com o nazismo fez com que as crianças se afastassem dele ("Ele era um estranho para nós, nunca falava conosco"), aproximando-se da figura materna ("Nunca encontrei tanta ética, tanta musicalidade e sentimento de justiça como em minha mãe").

Aos 18 anos, foi recrutado para lutar na guerra como "soldado alemão, pertencente a uma nação cheia de assassinos e racistas". Após ser transferido para o setor de cinema de propaganda e ficar preso num campo inglês, retomou os estudos de música em 1946.

Anátema em Darmstadt

Seu professor, Wolfgang Fortner, o apresentou naquele mesmo ano como aluno-sensação nos Cursos de Férias de Darmstadt. Entretanto, nos anos seguintes, a linha desse foro da música nova se radicalizou. Um furor ideológico se sobrepôs à estética, e a idealizada, quase impessoal asquese do serialismo integral era a única linguagem aceitável.

Com suas "concessões" ao passado, à eufonia, à tonalidade, Henze era persona non grata nos meios da vanguarda. Anos mais tarde, acentuaria a importância de se opor às "prescrições dos papas e regras dos monges", que se atiravam "jubilosos nos braços da era da tecnologia".

Em 1953, o músico trocou definitivamente a Alemanha pela Itália. A mudança coincidiu com a explosão de Henze no meio mais propício a seu talento: o palco teatral.

Ânsia de palco

Märchenoper Pollicino des deutschen Komponisten Hans Werner Henze
Cena da ópera 'Pollicino'Foto: picture-alliance/ dpa/dpawe

À ópera Il Re Cervo (1953-62), seguiu-se o sucesso de Der Prinz von Homburg, Der junge Lord – textos adaptados pela autora austríaca Ingeborg Bachmann–, Elegy for young lovers e The Bassarids (encomendada pelo Festival de Salzburgo de 1964) – ambas com libreto de W.H. Auden, também colaborador de Igor Stravinsky.

Num escrito de 1975, Henze define assim sua arte: "O teatro foi e é o meu território, tenho sempre que voltar a ele. Minha música anseia pelo gesto, a corporalidade e a plasticidade. Ela se entende como drama, algo que pertence intimamente à vida, e que não poderia existir na abstinência higiênica ou no particular, no doméstico".

Henze permanece um dos poucos compositores contemporâneos com presença assídua nos programas das casas de ópera tradicionais. Sua última obra do gênero foi Phaedra, que estreou em 2007 na Staatsoper de Berlim. O compositor também escreveu para o cinema, notadamente O jovem Toerless (1966) e A honra perdida de Katharina Blum (1975), ambos do alemão Volker Schlöndorff.

Posteridade

Mas o que dirá a posteridade sobre Hans Werner Henze?

Sua vaga na história da música do século 20 está assegurada. Se não fosse por qualquer outro motivo, a lista de suas associações – artísticas, pessoais, políticas – é um verdadeiro who's who da arte e da cultura europeia do pós-guerra: Edward Bond, W.H. Auden, Jean Genet, Pier Paolo Pasolini, Hans Magnus Enzensberger, Rudi Dutschke, Ingeborg Bachmann, sem falar em várias gerações de cantores, instrumentistas e regentes.

Virtuose das técnicas de composição, Henze é um desses artistas que pecaram pelo excesso de fertilidade: boa parte de sua obra é francamente dispensável. Mas não há como excluir a possibilidade de que gerações vindouras descubram uma série de obras-primas em meio a esse palheiro. Não seria a primeira vez que a história da música é forçada a se rever.

O octogenário vive em sua vila em Marino, nas cercanias de Roma, com o companheiro Fausto Moroni, "em meio a gente que nunca seria capaz de fazer o que meus compatriotas fizeram naquela época".