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Precursor Tintim

25 de dezembro de 2011

O sucesso do filme de Steven Spielberg sobre as aventuras do repórter Tintim chama a atenção para a Bélgica, um dos grandes centros produtores de quadrinhos no mundo.

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Tintim e seu fiel companheiroFoto: dpa

O jovem e astuto repórter e seu simpático cãozinho tiveram um volta triunfante em 2011, com o lançamento do filme As aventuras de Tintim, de Steven Spielberg.

Tintim é uma das histórias em quadrinhos mais traduzidas no mundo, e é em grande parte graças ao seu criador, Hergé, que a Bélgica se tornou o berço de outros heróis dos quadrinhos, como Os Smurfs e Lucky Luke.

"Hergé foi algo como a locomotiva dos quadrinhos no país", diz Willem de Graave, do Centro Belga de Quadrinhos, um templo em estilo Art Nouveau dedicado ao que os belgas chamam de "a nona arte".

"Ele foi o primeiro artista na Bélgica a alcançar a fama com seus quadrinhos", diz De Graeve. "Tintim foi um campeão de vendas desde o princípio e isso inspirou outros artistas daqui a seguirem os passos de Hergé."

Quando Hergé, cujo nome real era George Remi, começou a desenhar, no início dos anos 1920, os quadrinhos ainda eram um mercado restrito no continente europeu. Nos Estados Unidos as tiras de aventuras já haviam sido incluídas semanalmente nos jornais, enquanto na Europa os quadrinhos eram, em sua maioria, voltados para crianças.

Flash-Galerie Tintin Kongo
Personagem criado por Hergé nunca foi um grande sucesso nos EUAFoto: picture alliance/dpa

"Aí veio Hergé, com uma maneira completamente diferente de desenhar e contar histórias", diz De Graeve. As sombras e os contornos escuros foram substituídos por cores fortes e vibrantes, que permitem aos leitores entender toda a cena em segundos.

"Era um estilo extremamente simplificado, não só visualmente mas também em termos de diálogos. As histórias era muito bem estruturadas, e prenderam instantaneamente a atenção de toda uma geração de crianças", diz Yves Fevrier, da Fundação Hergé Moulinsart.

Ao seu peculiar estilo ligne claire (linhas claras), o artista de então 22 anos adicionou balões de diálogos e justapôs personagens contrastantes, como o volumoso e embriagado capitão Haddock, um antídoto perfeito ao estilo bom moço de Tintim.

BdT Papa Schlumpf und Handy Schlumpf
Os Smurfs são outro grande sucesso vindo da Bélgica

O estilo de Hergé virou moda e, em pouco tempo, revistas belgas voltadas aos quadrinhos começaram a publicar uma seleção de histórias locais e importadas, estas vindo principalmente dos Estados Unidos, pátria-mãe dos super-heróis.

A febre dos quadrinhos belga

As aventuras de Tintim foram publicadas pela primeira vez na revista semanal Le Petit Vingtieme. No final da década de 30, revistas como Spirou e Robbedoes já haviam surgido para alimentar crescente a febre dos quadrinhos.

Spirou foi um sucesso instantâneo com sua mistura de histórias curtas, piadas e quadrinhos americanos como Superman. Aí veio uma reviravolta histórica: com a invasão nazista, as editoras belgas foram forçadas a parar de publicar quadrinhos americanos. Elas se voltaram, então, para o produto nacional. Essa limitação inicial acabou tornando essas revistas ainda mais populares.

Em pouco tempo a Spirou começou a publicar quadrinhos de Andre Franquin, criador do anti-herói Gaston Lageffe, as histórias de Blake e Mortimer e também Lucky Luke, o cowboy criado por Morris. Artistas se reuniam em clubes e viajavam aos Estados Unidos para se inspirar e buscar novas ideias.

Os Smurfs, as pequenas criaturas azuis criadas por Peyo, também surgiram nas páginas da Spirou, já no final dos anos 1950. "As crianças gostaram tanto deles, quando eles apareceram nas páginas da Spirou, que elas escreveram para Peyo pedindo mais", conta François Deneyer, da Comic Strip House de Bruxelas, uma livraria e espaço de exposições.

Apesar de Tintim nunca ter alcançado grande sucesso nos Estados Unidos – apesar das inúmeras tentativas de Hergé –, os Smurfs e Lucky Luke tiveram a sorte de ser escolhidos pelos estúdios Hanna Barbera, na Califórnia, e se tornaram um grande sucesso na televisão.

Ajuda da Hanna Barbera

"Hanna Barbera foi decisiva para transformar os quadrinhos belgas num fenômeno mundial", conta Deneyer. "É pouco provável que, sem eles, Lucky Luke e Os Smurfs se tornassem tão conhecidos, e milhões de crianças não saberiam da existência deles hoje."

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Lucky Luke, o cowboy criado por MorrisFoto: XIAM

Lucky Luke era perfeito para o público americano. Morris havia passado anos nos Estados Unidos, cercado pela cultura e pelos filmes de faroeste. O cowboy que atirava mais rápido que a própria sombra tinha uma figura mais heróica que personagens como Tintim.

"Tradicionalmente, os americanos estão mais habituados a super-heróis, mas Tintim não tem o DNA de um super-herói, ele nunca se encaixou direito", diz Fevrier. "Hergé lamentou muito isso [não ter feito sucesso nos EUA].”

Walt Disney esnobou uma proposta de levar Tintim para os cinemas e os esforços de trabalhar com Spielberg no começo dos anos 80 também não deram certo. Pelos números atuais, quatro milhões de exemplares dos livros de Tintim foram vendidos nos Estados Unidos, uma fatia muito pequena do mercado local de quadrinhos.

"Foi o lugar onde ele nunca foi popular, mas, vamos falar a verdade, Tintim é meio chato e neutro", diz De Graeve. "Mas essa é também uma grande parte do seu apelo global. É muito fácil se identificar com ele. Tintim é como um envelope vazio, você abre e coloca o que quiser dentro."

Para provar sua teoria, De Graeve mostra alguns desenhos de Tintim fantasiado de uma velha senhora, um trabalhador chinês e como um menino africano. Depois, relata que a marca registrada do repórter, o topete loiro, surgiu por acidente.

Em sua primeira aventura, Tintim no país dos sovietes, o repórter passa grande parte do tempo num carro conversível em alta velocidade, o que faz seu cabelo ficar levantado. "Hergé manteve o topete para dar mais personalidade a Tintim2, diz De Graeve.

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Steven Spielberg já pensa em uma sequência para o filme de TintimFoto: AP

Tintim, a sequência

Spielberg anunciou que começa a trabalhar no ano que vem numa sequência do filme de Tintim, depois do grande sucesso de bilheteria do filme pelo mundo, mesmo antes da estreia americana, que só aconteceu no Natal.

O filme em 3D, com suas perseguições em oceanos, desertos e mercados árabes, alavancou a venda dos quadrinhos. Em Bruxelas, o número de visitantes nas lojas e centros dedicado aos quadrinhos também cresceu, assim como a procura por passeios turísticos que mostram os coloridos painéis com personagens espalhados pela cidade.

A Bélgica foi o primeiro país no mundo a criar uma escola especializada em formar artistas para quadrinhos. Hoje são seis escolas, e a indústria está em crescimento. A cada ano são publicados três mil livros de quadrinhos em francês.

"Os quadrinhos estão no sangue das pessoas aqui", afirma Deneyer. "Aqueles que leram Tintim e outros quadrinhos quando era crianças, antes da guerra, continuaram fãs mesmo depois de adultos e apresentaram essas histórias ao seus filhos. Vamos esperar que esse ciclo continue."

Autoria: Vanessa Mock (ms)
Revisão: Alexandre Schossler